LIBERDADE


Sempre acreditei que a Liberdade de cada um acaba onde começa a dos outros.
Liberdade não é uma palavra com um significado único, tem vários sentidos, mas há dois deles que são muito importantes sobretudo no momento actual e que são a liberdade social e a liberdade política, ou seja, a liberdade individual em relação aos outros e ao estado.
A realidade individual efectivamente acaba onde começa a segurança dos outros. Segurança tem um significado muito alargado quando em relação à Saúde, é uma questão social, não apenas um direito individual.

A Liberdade tem limites
Quando os cientistas sugeriram pela primeira vez o distanciamento social para toda a população do mundo como a medida mais adequada para se tentar “suprimir“ o Covid-19, foram os primeiros a admitir que isso seria difícil de implementar na chamada “sociedade livre”.
Todos os anti-ficar-em-casa, anti-máscaras, anti-testagem, anti-vacinas, fundamentam os seus argumentos nos seus próprios direitos individuais, não considerando a generalidade dos direitos das outras pessoas à sua volta.
Há efectivamente restrições da liberdade individual, mas o mesmo acontece quando a lei obriga a que se use cinto de segurança nos veículos e que os motociclistas tenham que usar capacete. Em ambos os casos as mortes e as lesões diminuíram quando a legislação se tornou efectiva.
A importância de usar máscaras não é apenas para proteger quem as usa do Coronavírus, é também para proteger os outros dos micróbios e vírus que quem usa a máscara possa ter.
As pessoas na proximidade de quem usa máscara não estão protegidas de todos os micróbios/vírus que tenha quem está a usar a máscara, mas apenas da maioria que é exalada.

Portadores assintomáticos
Há muitas pessoas na sociedade envolvente que, sem o saberem, são portadoras do vírus Covid-19. São os chamados portadores assintomáticos porque têm o vírus, mas sem qualquer sintoma de doença. No entanto, quando estão próximos de outras pessoas sem usar máscara, espalham o vírus, sem o saberem. Para o bem da sociedade em que estão inseridos e para reduzir os custos dos cuidados de saúde, as pequenas restrições da liberdade individual que são necessárias correspondem a uma decisão correcta na prevenção da disseminação do vírus e das suas consequências.
Costuma dizer-se que “A liberdade dos teus punhos acaba onde começa o meu nariz”…
E diria mesmo: A sua liberdade de não usar máscara acaba quando está na minha presença, já que nem eu nem o resto da sociedade querermos a saúde ameaçada só porque alguém pensa que de algum modo a sua liberdade foi restringida.

Há Séculos atrás
A mais importante decisão nos dias de hoje foi posta com clareza pelo Supremo Tribunal de Massachusetts em 1905 quando se discutia a vacinação obrigatória para a varíola. Foi declarado que “considerando o princípio do direito de autodefesa perante uma necessidade premente, uma comunidade tem o direito de se proteger de uma doença epidémica que ameace a segurança dos seus membros”.
O Tribunal rejeitou de forma categórica que “liberdade”, em termos legais, inclua o direito de os indivíduos tomarem decisões acerca da sua saúde em circunstâncias em que essas decisões possam colocar outros em risco.
No século XIX foi considerado que os países e as cidades tinham a autoridade para tomar as decisões necessárias para garantir o “bem-estar sanitário” da comunidade, tendo liberdade para se libertarem da doença. Criaram o “critério de dano” que dizia que “mesmo sendo a liberdade individual sacrossanta, deveria ser limitada quando prejudicasse outros”.
Em 1859 Mill escreveu no On Liberty: “A única finalidade para a qual a humanidade tem direito, individual ou colectivamente, de interferir com a liberdade de cada um, é para se proteger”.
Um outro autor escreveu em 1883 no The Lancet: “A liberdade de um homem não deve envolver riscos para os outros, não podemos considerar que haja alguma violação indevida da liberdade individual quando a autoridade sanitária actua a favor de toda a comunidade, querendo ter conhecimento da situação de cada um, relacionada com doenças perigosas para os outros”.
Com o Coronavírus a nossa liberdade acaba quando se põe os outros em risco, facilitando a transmissão de uma doença altamente contagiosa.
As pessoas estão a ser confrontadas (em teoria) com a escolha entre uma possível rápida recuperação da economia e a protecção das vidas de pessoas vulneráveis, mas a limitação das liberdades pessoais é muitas vezes necessária para garantir a liberdade para todos, garantindo melhor saúde e como consequência melhorando a situação financeira.

Em Negação, Novas variantes e Imunidade
Os que querem ignorar o distanciamento social, desprezar as máscaras, negar a testagem e a vacinação poderão estar a fazer uma afirmação de liberdade pessoal, individual, mas estão também a fazer perigar inegavelmente a liberdade de milhares de outras pessoas.
É imperativo falar especialmente dos “negacionistas da vacina”.
A recusa de alguns às vacinas implicará um alto custo para todos nós, não só no aspecto da saúde, mas também financeiro. Mesmo que a pandemia “esmoreça”, os milhares em todo mundo que recusaram a vacina podem transformar-se, se adoecem, em centenas de milhares de doentes precisando de cuidados de saúde. A sociedade precisa preparar-se melhor para cuidar dos problemas físicos e mentais que irão persistir. Os efeitos de evolução lenta da doença, quer para os doentes quer para as famílias, serão um efeito prolongado da pandemia que irá permanecer, mesmo depois da vacinação muito alargada.
Poderá ainda ser a oportunidade para o vírus fazer novas mutações, talvez mais resistentes, mas na verdade, embora muitos estejam preocupados com os efeitos futuros das vacinas, não parecem preocupados com as novas variantes que poderão ser cada vez mais difíceis de controlar.
Há também os que dizem que está a ser dada uma importância muito “inflacionada” ao coronavírus e que têm confiança que o seu próprio sistema imunitário será o suficiente para os proteger.

E se a imunidade natural dos seus Avós não for suficiente para os proteger???
O que é que andam a pensar estes hesitantes-resistentes à vacina, estes cépticos do Covid???
É difícil de compreender!!!
Parece mais estarem em negação ao Covid do que outra coisa qualquer. É mais negar a doença do que hesitar em fazer as vacinas.
Mas isto é afinal um grave problema de saúde pública, já que as vacinas não servem apenas para construir uma parede defensiva individual em volta dos jovens que as fazem.
A vacinação serve também para colectivamente se construir uma muralha em volta dos membros mais vulneráveis da sociedade.
Cada um que não se vacina é um buraquinho na muralha… e esses buraquinhos deixando caminho livre para o vírus entrar, vão levar a muitas situações tristemente desnecessárias.

Na verdade, nós não estamos sozinhos.

Dr.ª Maria Alice Pestana Serrano e Silva
Especialista de Medicina Geral e Familiar Administradora / Directora Clínica Luzdoc Serviço Médico Internacional / Medilagos
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